Solha frita com salada de Couscous, agrião e rúcula


A diferença está na salada. O peixe pode ser Solha ou outro do seu agrado. Neste caso utilizei Solha que temperei previamente com alho, sal e limão - meia hora antes de fritar.
Na hora de fritar, em óleo de amendoim bem quente, sacuda o alho, limpe o peixe, e passe-o por farinha de milho. Sirva acompanhado da salada.


Para uma salada para 4 pessoas prepare previamente 150 a 200g de couscous. Coloque o couscous num tabuleiro ou travessa e adicione-lhe água ou caldo de legumes a ferver, um fio de azeite e uma pitada de sal. A quantidade de liquido deve cobrir o couscous. Deixe que o couscous absorva todo o caldo e aumente de volume. Reserve.
Coza um ovo. 
Prepare alguns croutons - corte uma ou duas fatia de pão duro em cubos pequenos e salteie-os num fio de azeite até ficarem dourados. Utilizei pão escuro do dia anterior.
Lave e corte ao meio 8 tomates cereja.
Lave muito bem uma boa porção de agrião e rúcula, enxugue com um pano e coloque na saladeira ou num prato largo. Espalhe um pouco do couscous por cima, bem como metade dos croutons. Envolva tudo. Espalhe por cima o restante couscous, os croutons que sobraram, os tomates cortados, a clara do ovo cozido cortada às tiras e a gema picada. Tempere tudo com um fio de azeite, um fio de molho de soja e sumo de limão. Uma delícia!

25 de Abril. Presente!

Jarrete de vitela assado à "La Penela"

Já lá fui duas vezes e tenho sempre vontade de voltar. O Restaurante chama-se "La Penela" e visitei-o em A Coruña, junto à Puerta Real na Plaza de María Pita. Da mesma dona existe um outro "La Penela" em Madrid. 
Das duas vezes que lá fui comi um jarret de ternera asada de que  os espanhóis dizem, de llorar de gusto. Nunca mais me esqueci; foi a melhor vitela assada que comi até hoje.

Resolvi pesquisar a receita e li vários comentadores gastronómicos,  galegos e não só, mas parece que a receita é segredo de María Barallobre, a dona do restaurante. Os comentadores continuam, ainda hoje, a discutir se a carne é feita no forno se na panela, e como se consegue aquele delicioso molho grosso.  Um dia voltarei a este assunto para testar a receita de Santí Santamaría que fazia o Jarrete cozinhando-o na panela e no forno em tempos sucessivos.
Cansado e inconclusivo resolvi testar o que me pareceu, do que li, a melhor aproximação. Aqui está!




O primeiro cuidado a ter é na escolha da carne, que deve ser em peça única com osso (se possível, jarrete ou chambão traseiro).

Ingredientes

1,5 kg de jarrete de vitela
Sal e pimenta preta em grão
2 dentes de alho
Azeite
2 cebolas
2 cenouras
1 xícara de vinho branco
Caldo de carne apurado (2 a 3 xícaras)
1 kg. batatas pequenas


Preparação 
Esmague o alho no almofariz, com sal e grãos de pimenta preta e barre a carne. Reserve por algumas horas.
Numa panela deite um golo de azeite e doure a carne de todos os lados. Passe a carne para uma assadeira e adicione as cebolas picadas e as cenouras aos cubos.

Regue com o vinho e o caldo de carne e asse por aproximadamente 3 horas em forno a 130ºC.
Quando faltar 1h30m junte as batatas com uma noz de manteiga.
Quando a carne estiver pronta retire todo o molho e passe-o por um chinês, tentando passar tudo.
Se necessário, reduza o molho e corrija o tempero.
Volte a colocar a carne desossada e fatiada grossa no molho da assadeira, junte as batatas e sirva tudo bem quente.

Caril de Frango com maçã e gengibre


Uma excelente receita de frango de caril do Chef José Avillez e que eu adaptei (principalmente porque não tinha erva-príncipe que substitui por tomilho). No original esta receita é feita com peitos de frango. Como leva maçã, o molho de caril fica macio e cremoso, com paladares bem misturados e discretos de maçã, coco e gengibre.

Ingredientes
6 coxas e 6 pernas de frango
300 ml de leite de coco
50 ml de natas
1 cebola picada
2 maçãs Golden descascadas e cortadas em cubos
1 haste de tomilho
20 g de gengibre fresco
2 dentes de alho picados
1 colher de sopa bem cheia de caril
coentros q. b.
azeite q. b.

Para a marinada
sumo de meio limão
1 folha de louro
azeite q. b.
sal q. b.
pimenta preta de moinho q. b.

Tempere os peitos de frango com um fio de azeite, sal, pimenta, 1 folha de louro e sumo de meio limão e deixe marinar no frigorífico durante 2 horas. Num tacho com um fio de azeite, refogue o alho e a cebola, acrescente o haste de tomilho e a maçã cortada em cubos e deixe cozinhar em lume brando. Acrescente o caril, envolva bem e deixe cozinhar mais uns minutos. Acrescente o gengibre ralado, o leite de coco e as natas.
Deixe levantar fervura e cozinhe em lume brando durante 5 minutos. Retire a haste de tomilho e triture muito bem o preparado.
Passe o molho por um passador de rede e corrija os temperos. 
Salteie os pedaços de frango num fio de azeite bem quente. Deixe alourar bem e certifique-se que ficam bem passados. Junte o frango ao molho de caril e deixe cozinhar mais 5 minutos, aproximadamente.
Sirva de imediato com os rebentos de coentros.

Paris-Brest

Resolvi finalmente fazer o Paris-Brest. Este bolo, que tem uma história já muito divulgada, é vulgarmente vendido em pastelarias recheado com chantilly ao qual, por vezes, são acrescentados fios de ovos. Quando me foi apresentado era assim que vinha. As alternativas de recheio são, no entanto, tantas, que me parece mais adequado deixar o recheio ao gosto de cada um. O recheio que fiz é leve e macio, tipo mousseline.  Tem aroma de rum; a quantidade de redução de rum a utilizar é indicativa. Embora eu não o tenha feito, pode juntar-se aroma de baunilha.



Para a massa (Pâte à Choux)

250g de água
100g de manteiga à temperatura ambiente
150 gramas de farinha de trigo
3-4 ovos
1 pitada de sal
Amêndoas laminadas
Açúcar cristal e em pó

Ferva a água com a manteiga e o sal num tacho. Assim que esteja a ferver junte a farinha de uma só vez, baixe o lume, e continue a mexer até que se forme uma bola de massa que descole das paredes do tacho. Fora do lume, bata a massa para arrefecer um pouco. Incorpore os ovos, um a um, batendo sempre, até conseguir o ponto certo, suficientemente firme para poder ser vertida sobre uma base ou silpat sem perder a forma. O número de ovos a utilizar deverá ser avaliado em função da consistência obtida com a adição de cada um.
Ver a consistência na imagem já dá uma ideia.

Para levar o Paris-Brest ao forno utilize um tabuleiro onde deve colocar papel vegetal preparado com manteiga e farinha. Em alternativa utilize o silpat. Para fazer um circulo do tamanho adequado, utilize um aro que depois de mergulhado em farinha de trigo deve ser colocado sobre um silpat e, assim, desenhar a circunferência do tamanho correcto.

Coloque a massa no saco confeiteiro e faça três rodas com um bico de 2cm: uma exterior, que definirá o tamanho do bolo, um interior colada à primeira e uma terceira por cima das outras duas.
Polvilhe as rodas de massa com açúcar cristal e distribua, por cima,  as amêndoas laminadas. 

Leve ao forno préaquecido a 200ºC durante 5 a 10 minutos e depois baixe para 180 durante mais 15 a 20 minutos. Vigie para não  deixar queimar. Ao fim deste tempo, quando a massa já estiver alta e loura, abra a porta do fogão por uns segundos para sair a humidade. Baixe a temperatura para 150ªC e deixe ficar até a massa secar.

Faça o teste do palito e estando a massa seca retire do forno e deixe arrefecer. Corte transversalmente e abra, a roda Paris-Brest,  ao meio. Recheie a parte de baixo da massa utilizando o saco pasteleiro para distribuir o creme transversalmente. Cubra com a parte de cima da massa  e polvilhe com açúcar em pó. Reserve no frio.


Recheio de creme com rum para o Paris-Brest

7dl de leite
200g de açúcar
2 ovos
2 gemas
40g de farinha maisena
100g de manteiga à temperatura ambiente
1-2 colheres de sopa de redução de rum
recheio de uma vagem de baunilha (facultativo)

Ferva o leite com o açúcar.
Bata as gemas e os ovos até dobrarem o volume. Junte a maisena e bata novamente para misturar. Acrescente o leite aos pouco e vá mexendo. Leve ao lume e vá mexendo até engrossar.
Deixe arrefecer e adicione a manteiga, o rum e o miolo de uma vagem de baunilha. Bata bem até obter um creme leve. Reserve no frio até utilizar.

Coisas do dia seguinte

Demora muito?




A Change Is Gonna Come – Sam Cooke, 1963
I was born by the river in a little tent
Oh and just like the river
I've been running ever since
It's been a long, a long time coming
But I know a change gonna come, oh yes it will

Tarte de Laranja


Esta receita tem por base uma receita de tarte de limão do livro "Doze meses de cozinha", Edição Selecções do Reader's Digest, 1975. Para mim fica bem melhor feita com laranja; menos ácida e com sabor intenso a laranja. 

Massa:
300g de farinha
140g de manteiga ou margarina
140 g de açúcar
3 gemas
A massa para a tarte pode ser preparada de véspera e a forma já forrada pode ser deixada dentro do frigorífico depois de envolvida em papel de alumínio.

CREME:
3 ovos
90 g de açúcar
45g de manteiga ou margarina
3 laranjas

GUARNIÇÃO:
3 laranjas (aproximadamente 16 rodelas)
2dl de água
100g açúcar

Deite numa tigela as gemas, o açúcar, a farinha e a margarina amolecida. Trabalhe rapidamente todos os ingredientes com as pontas dos dedos. Forre com a massa, calcando aos poucos com as mãos, uma forma de tarte antiaderente de 24cm previamente untada com margarina e polvilhada de farinha (em alternativa utiliza papel vegetal). Pique a massa com um garfo e leve a cozer, a 170ºC durante 12 minutos.
Entretanto, prepare o creme: misture os ovos inteiros com o açúcar, a margarina derretida e o sumo das laranjas.
Retire a tarte do forno ao fim dos 12 minutos e deite dentro o preparado para o creme, com muito cuidado para não cair nada para fora. Leve novamente ao forno mais 20 minutos a 170ºC.
Enquanto a tarte acaba de cozer, prepare as laranjas para a guarnição: corte as laranjas em rodelas finas. Leve o açúcar ao lume com a água num recipiente largo e, quando obtiver uma calda fraca, introduza as rodelas de laranja, deixando ferver até ficarem transparentes.
Desenforme a tarte para o prato onde irá ser servida e deixe arrefecer podendo levar ao frio por alguns minutos para que o creme fique mais consistente. Enfeite a superfície com as rodelas de laranja escalfadas no xarope.

Nikias Skapinakis no Museu Coleção Berardo

Nikias Skapinakis está no CCB


de 28 Março 2012 a 24 de Junho 2012 

temos que ir...

Merengado de Chocolate



Bases de merengue
4 Claras
200g de açúcar
1 colher de sopa de farinha maisena
1 pitada de sal
1 colher de sopa de vinagre
Prepare as bases de merengue (três).
Bata as claras com a pitada do sal até ficarem bem firmes. Lentamente, junte o açúcar batendo sempre. Dissolva a maisena com o vinagre (se necessário acrescente uma gotas de água) e misture continuando a bater.
Num ou dois tabuleiros faça três bases, com a ajuda de um aro de 22cm, dividindo as claras em três porções e espalhando numa base de silpat ou papel vegetal ligeiramente untado com manteiga. Também pode utilizar uma forma redonda e fazer por três vezes. Leve ao forno a 170ºC até ganhar uma ligeira cor e ficar crocante por fora e macio por dentro. Deixe arrefecer e reserve.

Mouse de chocolate
1 tablete de chocolate de 200g
6 colheres de sopa de açúcar
6 ovos
125g de manteiga
Derreta o chocolate com a manteiga.
Separe as claras das gemas para taças diferentes.
Batas as gemas com o açúcar até ficarem fofas e claras. Junte o chocolate derretido com a manteiga e misture bem.  Bata as claras em castelo forte e misture suavemente com o preparado. Reserve no frio pelo menos 30 minutos.

Ganache para a cobertura
200g de natas
1 tablete de chocolate a 70%
Leve as natas ao lume até começarem a ferver. Retire do lume e junte o chocolate partido aos pedaços e mexa até ficar completamente dissolvido e cremoso.

Morangos para a cobertura
Lave bem 6 morangos sem lhes tirar o pé, espete-os em palitos, e mergulhe-os no ganache até meia altura. Espete a outra ponta dos palitos numa superfície onde seja possível mantê-los direitos e reserve (pode utilizar um ou mais pães duros como base).

Finalização
Divida a mousse em duas porções e, num prato grande, intercale com as bases de merengue – merengue, mousse, merengue, mouse, merengue. Cubra tudo com o ganache. Fica bem se os cremes escorrerem um pouco para fora do merengue. Junte os morangos e polvilhe com alguma aparas de merengue. Leve ao frio.

A Praxe


Quando se volta a falar nos actos indignos de algumas práticas praxistas nas nossas Universidades, ocorrem-me dois textos de 2003 com os quais estou genericamente de acordo. Onde se prova que o país não aprendeu nada, entretanto.

E que saudades de ler o quotidiano visto por Eduardo Prado Coelho, que nos deixou há, já vai fazer em Agosto, 5 anos.


A Estupidez da Praxe
Por JOSÉ PACHECO PEREIRA
Quinta-feira, 09 de Janeiro de 2003
A cultura juvenil revê-se num mundo de grosseria e ignorância.Se existisse uma colecção de retratos do nosso atraso, a cena da praxe ocorrida em Macedo de Cavaleiros era um deles. Saliente-se, aliás, que é apenas uma cena entre muitas que se repetem por todo o país de Braga a Faro e que esporadicamente são noticiadas, quando há uns estudantes corajosos que as denunciam, ou quando o abuso é intolerável e provoca danos. Ninguém, muito menos o ministério, nem os responsáveis pelas escolas, pode alegar desconhecimento.Parece que entre as cenas habituais das praxes aos caloiros, a julgar pela de Macedo de Cavaleiros, existe a prática de pôr os rapazes e as raparigas a quatro, feitos asno, cabra ou carneiro, mais ou menos vestidos, mas, pelo menos neste caso, com a roupa interior por fora, a ter que dizer umas obscenidades e a responder a umas perguntinhas perversas. Conhecem-se mil e uma variantes, todas boçais, destas práticas.Desta vez, mais uma vez, a brincadeira correu torta, porque a rapariga seviciada resolveu e bem queixar-se. O mais espantoso foi ver alguns estudantes, dirigentes académicos locais, a justificar o que se tinha passado - provavelmente já tinham estado numa idêntica postura a quatro a fazer de carneiros a balir e gostaram da experiência - e a dividir o mundo entre os a favor da praxe e "antipraxe". Sugeriam que alguém poderia evitar as cenas de humilhação sado-eróticas, com que se entretêm, proclamando-se "antipraxe", o que teria a penalização de serem excluídos das "actividades académicas". Gostaria de saber se dinheiros das instituições universitárias, que vem dos nossos impostos, podem ser canalizados para grupos de estudantes que excluem das actividades financiadas que patrocinam os que se recusam a fazer tristes figuras de asno. Rito de passagem? Mas que passagem? Cada vez mais a única coisa que os estudantes transportam do liceu para a universidade é a sua carga de ignorância. A cultura juvenil revê-se no Quim Barreiros, nas peripécias futebolísticas e no Big Brother, num mundo de grosseria e ignorância em que ler alguma coisa mais do que os jornais desportivos ou a "Caras" é excepcionalíssimo. Aliás, a praxe e as claques futebolísticas partilham muita coisa em comum - a violência latente, o culto pela obscenidade, a demarcação clubística entre "nós" e "eles". Tenho para mim que um dos sinais de degradação do ensino universitário nos últimos anos foi a progressiva introdução da praxe. Subitamente, após uma sadia desaparição da praxe nos anos 70, começou-se de novo a ver rapazes e raparigas vestidos de uma imitação de padres de gravata, o chamado "traje académico". Em muitos sítios onde este nunca fora "tradição", inventaram-se novos "trajes", todos eles ridículos e um pouco à moda dos bobos da corte das imagens medievais. Só lhes faltava pôr uns sininhos para parecerem o "coringa" dos baralhos de cartas. A praxe acompanhou a progressiva perda de qualidade do ensino básico e secundário, a crescente diminuição da importância da leitura e da oralidade consistente no ensino, a substituição de critérios de exigência e qualidade pelo mito do ensino "sedutor", em que as crianças "bons selvagens" se tornavam "bons" e menos "selvagens", por uma escola amável e onde não era preciso o esforço. A praxe mostra que um dos resultados finais da ideia da escola "soft", das pedagogias não directivas, foi mais o despertar do "selvagem" do que do "bom", para desgosto de Rosseau. A praxe estudantil foi sempre uma marca da mais provinciana universidade portuguesa - Coimbra -e dificilmente se implantou nas universidades de Lisboa e Porto, onde a população estudantil vivia em verdadeiras cidades, com vida própria fora do fechado mundo estudantil. Em Coimbra, uma cidade em grande parte dependente dos estudantes, dominada pela universidade, povoada por uma multidão de gente vinda do interior que aí habitava, vivendo em quartos e casas alugadas, o mundo do Palito Métrico floresceu. Os estudantes praxistas eram activos participantes da boémia da cidade e cultivavam uma cultura de estúrdia e do vinho, sob a suprema autoridade do estudante mais cábula, o "dux veteranorum", que obtinha o lugar na exacta proporção ao número de chumbos que tinha nos exames e aos anos que demorava a acabar o curso. A crise de 1969 provocou uma rara união entre os praxistas e os estudantes mais politizados, com o "dux" a apoiar a greve e com a suspensão da praxe pelo "luto académico". Este acto acabou por muitos anos com a praxe em Coimbra e varreu-a das universidades onde era claramente uma importação e uma imitação - Lisboa e Porto. No Porto, tenho no meu currículo de dirigente estudantil ter ajudado activamente a acabar com a ridícula parafernália dos "grelados" e "fitados", com as cartolas e penduricalhos que passeavam pela cidade durante a Queima das Fitas. Fui igualmente o autor anónimo, por razões óbvias, de um escrito com umas teses contra a Queima que circulou abundantemente nas três cidades universitárias. Nele, contrariamente ao que faziam os estudantes do PCP - que aceitavam a praxe, apenas achavam que ela devia ser suspensa por razões de "luto académico" -, combatia a praxe pela mundividência cultural que lhe estava associada, pelo seu conteúdo machista e marialva, pelo seu reaccionarismo estético, pela sua infantilização dos estudantes como seres irresponsáveis, que só serviam para brincadeiras de mau gosto. A Queima era então no Porto uma sucessão de "saraus", entremeados de "rallies", touradas, bênçãos, bailes, culminando num cortejo de carros e piadas que não tinham graça nenhuma e deixavam um rasto de gente bêbada por toda a cidade. Há poucos anos tive ocasião de observar o mesmo espectáculo decadente em Coimbra, só que o vinho tinto era substituído por "shots" e cerveja, não encontrando praticamente um estudante que estivesse sóbrio no dia do fim da Queima. Os hábitos da praxe que hoje são um anacronismo insensato remetem para um mundo corporativo medieval, para uma época em que as universidades tinham regimento e polícia e em que os estudantes se defendiam da autoridade dos "lentes", construindo um mundo de regras autónomas que reproduziam, aliás, o ambiente igualmente claustrofóbico da universidade "séria". Mas Coimbra nunca foi Heidelberg e o ambiente fechado, que páginas e páginas de sátira e de crítica já tinham denunciado, pela pena dos escritores século XIX e XX, não favorecia a liberdade de espírito, nem qualquer irreverência. Hoje no século XXI, a praxe é um traço anacrónico que puxa Portugal para um passado de que, mais que tudo, as universidades o deviam libertar.

Finalmente!
Por EDUARDO PRADO COELHO
Sexta-feira, 10 de Janeiro de 2003
Como já tratei deste tema diversas vezes (e como estou inteiramente de acordo com o que escreveu Pacheco Pereira no PÚBLICO de ontem), a tarefa está simplificada (ou talvez complicada): a praxe é uma estupidez, que tem vindo a ser vergonhosamente tolerada por professores complacentes e autoridades universitárias indiferentes. Que o actual ministro do Ensino Superior, Pedro Lynce, se prepare para investigar e legislar nessa matéria, eis uma atitude que me parece extremamente positiva (e digo-o tanto mais à vontade quanto tenho sido muito crítico de outras orientações deste ministro).Ver na televisão um jovem responsável associativo dizer que quando se perguntava (e escuso de repetir em que vexatórias circunstâncias) à aluna do Instituto Piaget se era virgem se estava apenas a querer saber o seu signo astrológico e quando se dizia à mesma aluna "dispa-se" se estava apenas a dizer: "diz: pâ-se", provoca uma tal náusea perante tanta javardice e má-fé que convém sermos claros: a praxe tem tantas derrapagens involuntárias ou programadas que tudo o que se fizer para acabar com ela (tanto no superior como no secundário) só pode ser útil para o país. Ganha-se sempre mais com isso do que aquilo que se perde. Donde, toda a legislação que puna impiedosamente aqueles que têm comportamentos atentatórios da dignidade humana só pode merecer o nosso aplauso.E não me venham com as habituais lérias relativas às tradições tão engraçadas e inocentes, e que se trata apenas de divertidos rituais com que se pretende integrar os debutantes no espírito da comunidade. Trata-se, sim, de algo que, independentemente das intenções conscientes dos seus promotores, pretende dar uma cobertura folclórica a práticas fascizantes de humilhação dos outros com uma dimensão sexual intolerável. É a oportunidade histórica de cada um fazer o seu pequeno "Salô" à portuguesa, com pacóvios pasolinis que fariam melhor se utilizassem a energia de que dispõem noutras actividades mais universitárias: se lessem e vissem mais clássicos, se estudassem mais, se reflectissem mais, em vez de criarem situações legitimantes de álcool e bandalheira. Esperemos que os ministros David Justino e Pedro Lynce estabeleçam alguma ordem nestas práticas e que as sanções tenham uma visibilidade exemplar. E lamentemos apenas que governos anteriores tenham sido incapazes de "levar a sério esta guerra" e tenham deixado morrer nos dédalos da burocracia as queixas que lhes chegaram ao conhecimento. Tal como nos casos de pedofilia, o sistema está feito para que se não levantem problemas e se amaciem as questões controversas. O que significa que há um certo número de valores que hoje consideramos património das sociedades democráticas modernas que ficam perdidos em gabinetes e relatórios.

Evolução da palavra latina "coquina"